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Geral - 31/10/2024
Impactos da reforma tributária nas operações de antecipação de recebíveis

Autor: Pedro Valim, Eduardo Froehlich Zangerolami, Evadren Antônio Flaibam e Marina Venegas

A reforma tributária aprovada pela EC 132/23, atualmente em fase de regulamentação pelos PLP 68/24 e 108/24, traz alterações relevantes para diversos setores da economia. Um dos setores particularmente afetados é o de antecipação de recebíveis, uma área essencial para a manutenção da liquidez e do capital de giro das empresas.

Nesse contexto, é importante compreender em detalhes como as operações de antecipação de recebíveis funcionam, as regras tributárias que atualmente regem essas operações e de que modo a reforma tributária poderá alterar a dinâmica desse mercado. O objetivo desta análise é detalhar esses aspectos e fornecer uma visão abrangente sobre os possíveis impactos e desafios que a reforma trará para o setor.

O que são as operações de antecipação de recebíveis?

As operações de antecipação de recebíveis, também conhecidas como RAV - Recebimento Antecipado de Vendas, são práticas comuns no mercado brasileiro. Em linhas gerais, a antecipação de recebíveis pode ser descrita da seguinte forma: quando uma transação é realizada por meio de captura (por exemplo, cartão de crédito ou de débito), no âmbito de um arranjo de pagamento, o consumidor final efetua o pagamento ao emissor do cartão. Este, por sua vez, liquida os valores transacionados junto à credenciadora.

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Já nas operações pós-contratadas, a antecipação de recebíveis é solicitada pelo usuário final recebedor de forma pontual e se aplica a um conjunto específico de transações já realizadas. Nesse caso, o estabelecimento comercial que deseja antecipar seus recebíveis escolhe as transações que deseja liquidar antes do prazo e solicita à credenciadora ou subcredenciadora o pagamento antecipado, normalmente em contrapartida de um desconto (deságio) sobre o valor total da transação.

Independentemente da modalidade escolhida, pré ou póscontratada, é importante observar que a antecipação de recebíveis de vendas corresponde, conforme analisado pela Procuradoria do Banco Central do Brasil, a um "abatimento antecipado de um passivo", uma vez que nada mais é que um adimplemento antecipado de uma obrigação da própria credenciadora (ou subcredenciadora).

A importância da antecipação de recebíveis para as empresas

A antecipação de recebíveis desempenha um papel fundamental na gestão financeira de muitas empresas, especialmente no Brasil, onde o ambiente de negócios pode ser desafiador, com altos custos operacionais e acesso limitado a crédito. Esse tipo de operação permite que as empresas obtenham liquidez imediata, essencial para manter a continuidade de suas operações, investir em crescimento e evitar endividamento excessivo.

Empresas de diversos tamanhos, desde pequenos comerciantes até grandes corporações, utilizam a antecipação de recebíveis para estabilizar o fluxo de caixa sem que precisem recorrer a empréstimos ou financiamentos. Isso é especialmente relevante em setores com longos ciclos de venda ou em períodos de crise econômica, em que a necessidade de liquidez torna-se ainda mais urgente. No entanto, a antecipação de recebíveis também envolve custos, principalmente na forma de deságios, que variam de acordo com o prazo de antecipação e as condições do mercado.

Apesar de ser uma ferramenta financeira valiosa, a antecipação de recebíveis não deve ser confundida com outras operações financeiras, como a cessão de recebíveis ou a prestação de serviços de intermediação de pagamentos. As operações de antecipação de recebíveis têm características únicas, que as diferenciam de outras formas de obtenção de liquidez e sua tributação tem sido motivo de debate entre especialistas e autoridades fiscais.

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O impacto da reforma tributária no setor de antecipação de recebíveis

Com a proposta de reforma tributária atualmente em discussão, várias áreas do setor financeiro, o que passou a incluir o mercado de antecipação de recebíveis, serão diretamente impactadas.

O PLP 68/24 traz uma série de mudanças na tributação de bens e serviços, com destaque para a criação de dois novos tributos: a CBS - Contribuição sobre Bens e Serviços, que substituirá o PIS, a Cofins e o IPI - Imposto sobre Produtos Industrializados, e o IBS - Imposto sobre Bens e Serviços, que substituirá o ICMS - Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e o ISS. Esses tributos seguirão o modelo de IVA-Dual - Imposto sobre Valor Agregado, comum em outros países.

Uma das principais mudanças trazidas pela reforma é a tributação das operações de liquidação antecipada de recebíveis pelos novos tributos CBS e IBS. Segundo o art. 211 do PLP 68/24, a liquidação antecipada de recebíveis de arranjos de pagamento será tratada da mesma forma que os demais serviços de arranjos de pagamento, de modo que a base de cálculo corresponderá ao desconto aplicado na liquidação antecipada, com a dedução de valor correspondente à curva de juros futuros da taxa Selic, pelo prazo da antecipação, e as alíquotas aplicáveis serão uniformes em todo o território nacional.

Além disso, o art. 184 do PLP 68/24 prevê que as alíquotas do IBS e da CBS aplicáveis aos serviços financeiros, assim entendidos os serviços prestados pelos arranjos de pagamento, serão estabelecidas em duas fases distintas. Entre 2027 e 2033, as alíquotas serão ajustadas de forma a manter a carga tributária incidente sobre as operações de crédito realizadas por instituições financeiras bancárias. A partir de 2034, as alíquotas serão fixadas com base nos valores praticados em 2033, garantindo uma transição suave para o novo regime tributário.

A tributação dos FIDCs na reforma tributária

Outro ponto relevante da reforma tributária é o tratamento dado aos FIDCs - Fundos de Investimento em Direitos Creditórios, que desempenham um papel importante no mercado de antecipação de recebíveis. O PLP 68/24 prevê que os FIDCs que realizarem liquidação antecipada de recebíveis de arranjos de pagamento serão tratados como contribuintes do IBS e da CBS, conforme o §3º do art. 211. Essa mudança visa impedir que os FIDCs sejam usados como veículos de planejamento tributário, em vez de outras formas de intermediação financeira (funding), prática que poderia proporcionar vantagens fiscais.

A reforma também traz um critério claro para diferenciar os FIDCs operacionais dos FIDCs com fins exclusivamente de investimento.

Segundo o art. 190 do PLP 68/24, os FIDCs que liquidem antecipadamente recebíveis comerciais por meio de desconto de duplicatas, notas promissórias, cheques e outros títulos, quando não forem classificados como "entidades de investimento", conforme definido pelo art. 23 da lei 14.754/23, estarão sujeitos às regras específicas de tributação para as operações de crédito, de câmbio, com títulos e valores mobiliários e instrumentos financeiros derivativos, de securitização e de faturização.

Isso significa que os fundos que liquidem antecipadamente recebíveis comerciais, desde que qualificados como entidades de investimento, não serão onerados desnecessariamente, mantendo a tributação focada nos FIDCs que atuam diretamente nesse mercado específico de antecipação de recebíveis comerciais.

Importante observar que, ao determinar a incidência da IBS e da CBS sobre os FIDCs que realizam a antecipação de recebíveis de arranjos de pagamento, a regulamentação da reforma tributária se absteve de distinguir os FIDCs qualificados ou não como entidades de investimento, de modo que, em uma análise preliminar, todos os FIDCs que liquidem antecipadamente recebíveis de arranjos de pagamento serão onerados.

 

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